Gestão Criativa
Por Maria Rita Gramigna
29/03/2007


A dinâmica dos cenários atuais resulta no estabelecimento de um clima de dúvidas e incertezas frente às mudanças e aos desafios do cotidiano.

Observando à nossa volta, podemos perceber no Brasil um quadro repleto de situações paradoxais, que se bem administradas e tratadas com adequação, poderão ser tratadas como oportunidades.

É necessário enxergar por trás do espelho, desvendar os dois ângulos da questão. Se por um lado, estamos diante de grandes empecilhos, por outro temos uma série de forças propulsoras à ação, a saber:


FORÇAS PROPULSORAS

• Número significativo de empresas que se certificaram pelas normas ISO, tornando-as mais competitivas (produtos e serviços com maior qualidade e menor preço);

• Clientes a cada dia mais conscientes e investindo na dobradinha “qualidade X preço”.

• Flexibilização gradativa da legislação brasileira, permitindo nossa participação em novos mercados;

• Estabilização relativa da economia do Brasil, gerando um padrão de vida um pouco melhor para trabalhadores e maior segurança nos investimentos dos empresários;

• Parque industrial sendo modernizado através de investimentos próprios ou em parceria com empresas estrangeiras;

• Empresas prestadoras de serviço já focadas nas necessidades dos clientes, melhorando seu padrão de atendimento;

• Tecnologia da informação à disposição e com custos razoáveis;

• Em paralelo aos investimentos em tecnologia os empresários estão priorizando programas de desenvolvimento gerencial e de equipes,

• Os modelos de gestão estão mudando, passando de uma cultura centralizadora e autoritária para a cultura participativa com espaços para ações empreendedoras;

• Níveis hierárquicos sendo reduzidos, permitindo a agilização nos processos decisórios;

• Clima de trabalho em transformação, fazendo com que os trabalhadores se sintam mais motivados e comprometidos em suas funções;

FORÇAS RESTRITIVAS

• Custo Brasil (carga tributária altíssima) interferindo de forma negativa nas exportações;

• Algumas empresas certificadas pelas normas ISO preocupadas com produtividade e controles ainda não perceberam a necessidade de investir nas pessoas - que realmente fazem a qualidade.

• Alguns pólos industriais implantando programas de demissão em massa, causados pela modernização dos seus parques (automação);

• Inúmeros programas de demissão voluntária incentivada (tanto em empresas do governo quanto em empresas privadas) aumentam o rol de desempregados;

• Profissionais pouco preparados, que quando se vêem sem possibilidades de retorno ao mercado de trabalho, partem para a iniciativa privada e montam pequenas empresas. Poucas sobrevivem. Permanecem no mercado aquelas que têm algum diferencial;

• A mudança de modelos de gestão - do centralizador ao participativo - trouxe insatisfação para aqueles que tiveram que dividir o poder em suas células de trabalho. Conflitos latentes hoje são explicitados.

• Apesar de bem equipadas tecnologicamente, a maioria das empresas ainda têm dificuldades para lidar com as mudanças de paradigma e seus profissionais apresentam discursos modernos e uma prática baseada nas crenças e valores antigos;

• Os jogos de poder, a competição interna, a centralização de informações e outras atitudes pouco positivas permanecem como práxis;

• Nossos produtos e serviços têm custo muito caro;

• A forma de pensar dos dirigentes ainda está baseada no lucro fácil, mesmo com a economia mais estável;

• Redução do consumo de produtos e serviços e aumento da economia informal.





Como reagir e otimizar ações para colher frutos do atual contexto?

Se o desânimo e o desespero nos contaminar e deixarmos o barco correr, certamente vamos ter surpresas desagradáveis, que poderão afetar sobremaneira a sobrevivência de nossas empresas.

Investir em um novo pensar e um novo agir impulsiona as pessoas a mudar e melhorar o que deve e pode ser mudado e melhorado.

Que motivos levam dirigentes e equipes à paralisação, a repetição de fórmulas prontas e/ou a manutenção de um status-quo?

Provavelmente porque a maioria das pessoas se julga pouco criativa.

Este autoconceito é constatado quando indagamos a alguém sobre suas três maiores qualidades. Em minha última enquete, menos de dez por cento apontou a criatividade.

Tal fato repete-se em outras partes do mundo. No mês de julho, quando freqüentava as aulas de mestrado na Universidade de Santiago de Compostela - Espanha, pude conviver com participantes oriundos de diversos países latino-americanos, Europa e Estados Unidos. Em nossas apresentações, um dos mestres pediu que falássemos sobre nossas qualidades. Somente duas pessoas se nomearam criativas.

QUEM PRECISA SER CRIATIVO?

Até bem pouco tempo a criatividade foi tratada como um dom reservado a algumas pessoas e pouco valorizada nos meios empresariais - período onde as mudanças eram quase imperceptíveis. Tempo de calmaria.

O barco navegava em águas mansas, sem alterações na maré, não sendo necessário alterar seu curso. Justamente, na calmaria perdeu-se de vista o valor da criatividade e da necessidade de buscar outras alternativas. Hoje estamos vivendo em tempos onde os mares a cada dia se agitam mais sendo necessário descobrir novas rotas, novos procedimentos de navegação - ou o barco poderá afundar.

A quem cabe esta tarefa? A todos que estão envolvidos em qualquer empreendimento - do comandante aos ajudantes. Contudo, a principal responsabilidade pela iniciativa do processo é do dirigente - aquele que detém o poder de decisão e que determina os rumos da empresa. É ele quem inicia o processo. Inovação e criatividade são requisitos imprescindíveis no atual contexto. Cabe ao dirigente buscar respostas às perguntas: Criar para quê? Mudar em que direção? Inovar de que maneira?

FATORES QUE ESTIMULAM A CRIATIVIDADE

No prefácio do livro “Grande idéia - como desenvolver e aplicar sua criatividade”, o autor Charles Thompson entrevista Yoshiro Nakamats - detentor de mais de duas mil e trezentas patentes de invento, dentre eles o disquete flexível de computador, o compact disc, o CD player e o relógio digital, que resumi a título de ilustração sobre ser criativo.

Nas falas de Yoshiro, percebemos algumas condições básicas, favoráveis à criatividade que poderão servir como orientação e avaliação de ambiente, para aqueles gerentes que pretendem iniciar um programa de criatividade em suas empresas.

ENCARAR A CONCORRÊNCIA COMO DESAFIO

“Em meu país (Japão), a concorrência é inacreditavelmente intensa. Desde cedo as crianças japonesas estão sob uma enorme pressão para aprender”.

DAR ESPAÇO E LIBERDADE PARA CRIAR

“Eles (seus pais) me deram liberdade para criar e inventar - o que venho fazendo desde que sou capaz”.

“A liberdade é o mais importante de tudo, É crucial ser capaz de encontrar tempo e liberdade para desenvolver as suas melhores idéias”.

EXISTÊNCIA DE AMBIENTE ADEQUADO

“Ao desenvolver idéias a primeira regra é: você deve ficar calmo. Assim, criei aquilo que chamo de a minha sala estática. É um lugar de paz e silêncio”.

“Vou à sala fazer associação livre. Vou jogando idéias e deixo minha mente divagar”.

IDENTIFICAÇÃO DO MELHOR MOMENTO PARA GERAR IDÉIAS

“Duas vezes por dia, dou cochiladas de trinta minutos numa cadeira especial que projetei - a cadeira CEREBREX”.

BUSCAR UM MÉTODO, AGIR COM FOCO.

“Encorajo a mim mesmo a atravessar os três elementos da criação:

• Teoria do conhecimento;

• Inspiração;

• Praticabilidade, viabilidade e negociabilidade.”“.

CULTURA DE PARTICIPAÇÃO E POSSIBILIDADES DE INTERAÇÃO

“Precisamos abrir o mundo. Precisamos compartilhar, interagir”.

ESFORÇO E SATISFAÇÃO COM RESULTADOS

“Eu sempre me esforço para melhorar. Você precisa usar a sua vida. Se você tem potencial de 10 e usa só 8, isso não é satisfação. Se você tem um potencial de 10 e usa 12, isso é satisfação”.

IDADE E CRIATIVIDADE

“Aos 62 anos sinto que ainda sou relativamente jovem. Muitos cientistas acreditam que podemos viver até os cento e vinte anos”.



MUDAR PARA CRIAR OU CRIAR PARA MUDAR?

Mudança e criatividade caminham lado-a-lado.

Mudar é um processo dinâmico. Exige habilidade para perceber cenários e contextos, sensibilidade e vontade de melhorar algo, esforço na busca de meios para efetivar a mudança, sistematização de procedimentos, decisão e coragem para agir. Tornando-nos criativos estaremos nos aperfeiçoando enquanto pessoas, melhorando nossa forma de viver, tornando-nos mais felizes e plenos, o que certamente se refletirá em nossas empresas. Na medida em que conquistamos pequenos saltos qualitativos em nossas vidas, tornamo-nos mais disponíveis, produtivos e úteis àqueles que nos rodeiam.



A criatividade representa uma revolução mental, uma nova forma de conhecer e pensar, que enfatiza a evolução do saber. Implica na construção de novos conhecimentos e na maximização da dimensão inventiva e fantástica da mente humana e sua capacidade de ampliação.

A criatividade não nos ensina o que aprendemos nos livros e sim as práticas diárias e reflexões de todas as formas de expressão, unidas à imaginação transformadora e transgressora que convertem o ser humano em um crítico e transformador de seus contextos.

HOJE, MAIS DO QUE NUNCA, AS EMPRESAS PRECISAM DE PESSOAS CRIATIVAS.

Maria Rita Gramigna é Mestre em Criatividade Total Aplicada pela Universidade de Santiago de Compostela (Espanha). Graduada em Pedagogia pela Universidade Federal de Minas Gerais e pós-graduada em Administração de Recursos Humanos pela UNA – União de Negócios e Administração (MG). Atua no Mapeamento de Competências, contatos estratégicos com clientes, capacitação gerencial e treinamento da equipe de consultores da MRG Consultoria e Treinamento Empresarial.