A Marca, o Meme e os Demons
Por Fred Tavares
22/08/2007


Posicionar a marca na mente do mercado é uma tarefa que envolve um conjunto de providências para que tal objetivo seja devidamente realizado.

Dois aspectos são importantes para a construção e fixação da marca na mente do mercado: o meme e os demons .

O que é um meme ?

A tese é do biólogo inglês Richard Dawkins, no livro The selfish gene ( O gene egoísta ), Oxford University Press , 1989. Para Dawkins, memes são como vírus: segundo ele, genes são copiados, replicados, de pais para filhos, de geração para geração; um meme por analogia, é qualquer coisa que se replica de cérebro para cérebro, por qualquer meio disponível para isso .

Segundo Nobrega (2001: 152):

Exemplos de memes são melodias, slogans , moda (...). Assim como genes se propagam saltando de corpo para corpo, memes se propagam saltando de cérebro para cérebro, por um processo que pode se chamar “imitação”. (...) Meme é um tipo de “vírus” que parasita a mente.

Esse processo, quando aplicamos ao marketing , pode ser formulado assim:

Marcas ou produtos competem por espaço dentro da sua cabeça. Os vencedores enchem sua mente de cópias deles próprios. O número de cópias dessa “coisa” dentro da mente é o que determina a marca vencedora. Qualquer fator que faça a marca aparecer, dentro da mente, com mais cópias do que a marca concorrente, oferece vantagem.

Uma marca como Coca-Cola replica-se de mente em mente, via um processo análogo ao dos vírus.

Marcas campeãs como Coca-Cola penetram nos cérebros e tomam conta deles como parasitas. Pulam de uma mente para a outra.(...) parasitismo cerebral.

Coca-Cola é a marca mais valiosa do mundo pela sua capacidade de ocupar mentes. Não é o sabor que conta (...). Marcas andam por aí cavalgando mensagens publicitárias, à procura de mentes parasitáveis para infectar. (Nobrega, 2001: 147)

São mesmo como vírus ... vírus na mente ... são memes .

Como analisa Nobrega (2001), a mente virgem, aquela que não foi ocupada por nenhum meme , é a melhor coisa que pode acontecer em marketing .

Marcas são memes . Avaliando essa tese, o meme funciona como um significante da marca. Ele é uma “replicação” da estratégia da marca (significado) atuando na mente do mercado. O meme para “contaminar” a mente, deve estar orientado pelo foco da marca (posicionamento / diferenciação).

Nobrega (2001: 154) destaca, também, a teoria da seleção darwiniana sobre a saturação dos memes : “basta que uma idéia entre em competição com outra pelo privilégio de ‘infectar' você, que entra em cena a seleção darwiniana. Marcas são memes ”.

Os memes se aplicam à teoria do Princípio de Gause da Exclusão Competitiva em branding (duas marcas com a mesma estratégia – foco – não podem coexistir na mente do mercado. Uma delas vai “morrer”).

A teoria da memética pode ser considerada, também, através da lei da liderança de Ries (1993: 2), que corrobora o princípio de Gause e da seleção darwiniana: “É melhor ser o primeiro na mente do que o primeiro a entrar no mercado”. Para ter sucesso, singularidade (exclusividade) e o pioneirismo na mente ajudam o meme a se propagar. O anti-vírus é a saturação da competição entre memes no mesmo foco. Pode matar a idéia.

Portanto, para que as marcas tenham como impactar a mente, o ponto de partida é a estratégia (posição única) e o seu conjunto de vantagens competitivas para sustentá-la (Porter, 1999: 52-56). As táticas, orientadas pela estratégia (e o seu posicionamento) devem produzir memes que estejam focalizados na sua posição exclusiva / pioneira (na mente do mercado). Para que eles cheguem à mente, parasitando-a, a massificação da comunicação (publicidade / propaganda) é fundamental tendo em vista o processo da replicação. Sem a comunicação não existe meme .

Para as marcas se amplificarem é indispensável a criação de um arquétipo emocional (mito de origem) dentro da brand strategy . Os componentes da marca (produto, lingüísticos e psicológicos) dão a base criativa para o insight dos novos memes .

Por exemplo, as campanhas publicitárias e os personagens da Coca-Cola são boas idéias de memes : “Papai Noel bebendo Coca-Cola”, “o urso polar”, os jingles , os slogans , “Pelé e Coca-Cola”, entre outros. São marcantes, entram na mente, replicam, replicam, replicam ... infectam e vendem, vendem, vendem ... e tornam a marca de valor único.

Pode-se até questionar: “se os memes são vírus, eles têm vida curta?” Sim, alguns duram pouco. Mas a comunicação se encarrega de gerar novos memes de acordo com o momento das oportunidades de mercado, e em função do que está na mente das pessoas. O campo criativo é interminável. O que é preponderante, é ter criatividade, coerência e muita repetição. Orientar-se sempre pela estratégia para focalizar novos memes . De certo, os memes fortalecem o marketingmind brand positioning e ajudam a “multiplicar” o seu brand equity .

A teoria defendida por Dawkins – os memes –, é também a base do pensamento de Seth Godin, em seu livro Marketing ideavírus: como transformar suas idéias em epidemias que irão incendiar o mercado :

Richard Dawkins, um brilhante teórico da evolução, tem a sua própria palavra para designar o fenômeno que estou chamando de vírus de idéia: memes . Ele explica que um meme seria como um organismo vivo, sobrevivendo não no mundo real, mas em nosso mundo das idéias. Como um organismo vivo, os memes podem viver ou morrer, e o que é mais importante, eles podem evoluir. (Godin, 2001: 119)

Só para registro: a tese do biólogo Dawkins foi lançada no final da década de 80. E o livro escrito por Godin (2001) está todo ele baseado na teoria dos memes . Entretanto, Seth Godin apenas menciona (uma única vez) Dawkins em seu trabalho.

De volta ao tema, como vimos, os memes funcionam para a construção e fixação da marca na cabeça das pessoas. Entretanto, para que cumpram o seu papel de “parasitar” e “infectar” a mente, o ideal é entrar em uma mente virgem (Lei da Liderança), ainda não ocupada. Por isso que o sucesso dos memes depende dos demons .

Afinal, o que são demons ?

Segundo Steve Pinker (1998: 81), em Como a mente funciona , demons podem ser assim entendidos:

Um sistema de produção contém uma memória e um conjunto de reflexos, às vezes chamados demons por serem entidades simples, independentes, que ficam parados à espera de entrar em ação. A memória é como um quadro de avisos no qual se colocam os comunicados. Cada demon é um reflexo automático que espera por um comunicado específico (...).

Demons são arquivos mentais. Segundo Pinker (1998), a diferença entre eles e os arquivos de computadores, é que os demons dificilmente são deletáveis por serem construídos e localizados na memória de longo prazo, que é cristalizada pela emoção. Não dá para “apagar” da mente. “Porque o cérebro não é computador” (Trefil, 1999: 134).

Assim, as declarações em um sistema de conhecimento são inscrições em uma linguagem de pensamento, o mentalês. (...) Um dos demons é projetado para responder a essas perguntas de consulta escaneando à procura de marcas idênticas nas colunas Objetivo e Memória de Longo Prazo. (Pinker, 1998: 82-83)

Os demons são como símbolos que representam algum conceito. São acionados por uma inscrição ou palavra-chave (Pinker, 1998: 84). Para a marca ser lembrada, de forma diferenciada, deve entrar na mente simbolizando algo que ainda não foi inscrito. Princípio de Gause e Lei da Liderança são pontos que, também, devem ser observados, pois uma nova marca para ser percebida na mente deve construir o seu próprio demon .

As marcas fortes devem criar os seus demons na memória de longo prazo do consumidor. Para terem força, não podem copiar demons instalados na “HD mental” do consumidor.

Ries (1993: 6-13) aponta que a marca deve criar uma categoria, quando o espaço já está tomado. Um posicionamento eficaz implica na confecção de um demon exclusivo na mente do mercado.

A tese dos demons está relacionada às teorias defendidas por Porter (1999) e Ries (1989) sobre posicionamento. Ter uma posição única e singular dentro do mercado e ainda focalizar uma imagem diferenciada na percepção do público são possíveis, se a marca tiver um demon exclusivo. Quando se pensa em refrigerantes sabor Cola ... quando se vê a garrafa ... a cor vermelho ... todos levam ao demon Coca-Cola.

Para uma marca ser bem lembrada, ter um demon é condição estratégica de sucesso.

Demon e estratégia; meme e tática. Todos voltados para construir, fixar e posicionar uma marca na mente do mercado.



Referências Bibliográficas

GODIN, Seth. Marketing ideavirus: como transformar suas idéias em epidemias que irão incendiar o mercado. Rio de Janeiro: Campus, 2001.

NOBREGA, Clemente. Supermentes: do big bang à era digital . São Paulo: Negócio Editora, 2001.

PINKER, Steven Como a mente funciona . Trad. Laura Teixeira Motta. São Paulo: Companhia das Letras, 1998.

PORTER, Michael E. . Competição = on competition: estratégias competitivas essenciais. Rio de Janeiro: Campus, 1999.

RIES, Al; TROUT, Jack. As 22 consagradas leis do marketing. São Paulo: Makron Books, 1993.

RIES, Al; TROUT, Jack.Marketing de Guerra II: a ação. São Paulo: McGraw Hill, 1989.

TREFIL, James. Somos diferentes? Um cientista explora a inteligência ímpar da mente humana. Rio de Janeiro: Rocco, 1999.