A Marca Rio de Janeiro: como o mercado do luxo pode significar oportunidades
e riscos para nossa cidade
Por André Dametto
22/03/2010
É fato: a cidade do Rio de Janeiro é atualmente um dos lugares mais
propícios no mundo para alavancar oportunidades de negócios. Os futuros
eventos esportivos que a cidade sediará impactam diretamente o setor do
turismo, movimentando assim diversos setores da nossa economia. O negócio do
luxo, por sua vez, cresce vertiginosamente em todo o planeta, e as pesquisas
evidenciam a correlação deste setor com o mercado de turismo. Ou seja: o Rio
tem tudo para ser “a bola da vez” no global luxury market, com direito a
observadores internacionais de todos os cantos atentos em nós . Sinais
comprovando este movimento não faltam: o Rio foi capa de março na renomada
revista inglesa Monocle, celebrities internacionais visitam cada vez mais a
cidade e vemos marcas desesperadas por abrir suas concept stores por aqui.
Pois bem, é fácil perceber as oportunidades que este cenário oferece para o
setor do luxo, mas aí reside um grande risco: o crescimento amorfo deste
mercado. Vamos a um fato curioso: experimente digitar no Google a seguinte
expressão: Rio de Janeiro luxo. É de espantar que dentre as dez primeiras
indicações, sete refiram-se ao setor imobiliário e da prostituição. Sim, as
famosas acompanhantes de luxo. Nada contra estes ramos de trabalho, mas
certamente não foram as referências que os estrategistas tenham priorizado
para o mercado de luxo carioca. Bem, que estrategistas? Aí reside a segunda
armadilha: não existe uma discussão séria, planejada e integrada sobre o que
seria este branding luxo carioca. Os agentes do segmento do luxo ainda
cuidam de seus negócios de forma isolada, sem considerar os ganhos que uma
estratégia global poderia conferir a todos estes agentes.
Visando provocar o debate do projeto desta nova marca, recentemente contatei
cerca de 70 personalidades nos mais diversos segmentos da sociedade carioca:
empresários, consultores, pesquisadores, jornalistas, políticos,
profissionais de moda, entretenimento, gastronomia, hotelaria. O saldo não
foi muito luxuoso: obtive oito rápidos e generosos elogios para o arrojo da
ideia, três e-mails mais elaborados, com críticas relevantes, e apenas um,
eu disse um bate-papo real. A conclusão que tiro disso tudo: não se
prioriza, mesmo entre a inteligência carioca, o planejamento da identidade
desta marca luxo carioca. Nos retornos que recebi, um deles foi bem
enfático: aqui no Rio de Janeiro vale a lógica do “meu pirão primeiro”,
ninguém quer abrir o jogo com o outro. Ou seja, em nome de ganhos imediatos
no curto prazo, se perde a chance de planejar um ganho imensamente maior no
médio-longo prazo. Um breve estudo sobre ciência do planejamento aprofunda o
que eu quero dizer.
Esta experiência real mostra que não se quer (ainda) discutir de forma
integrada uma visão para este mercado, quais são as nossas forças,
fraquezas, oportunidades e ameaças, e estratégias para lidar com este
cenário. Não é à toa que ainda encontramos os recorrentes problemas no
serviço prestado em experiências de compra ditas “classe AAA”. Ou então a
frustrada tentativa de algumas marcas cariocas de copiar um estilo americano
e até mesmo europeu, sob calor de 40 graus.
Sendo assim, é fundamental e urgente que nos preparemos para a vindoura
massa de pessoas afoitas em conhecer o que o Rio tem de melhor para
oferecer. Minha hipótese é que o desenvolvimento da marca Rio de Janeiro tem
tudo para alavancar nosso mercado de luxo local. Cabe para isso recorrer às
histórias da nossa cidade e aos valores que nos diferenciam do restante do
mundo, diferenciando o mercado de luxo carioca. Esta iniciativa servirá
inclusive para sustentar este mercado após a realização dos eventos
esportivos. Desta forma, seriam definidas experiências de luxo EXCLUSIVAS da
nossa cidade, incapazes de serem reproduzidas em Paris, Dubai ou Nova York,
por exemplo. As ideias são muitas: a customização de bolsas de grifes
européias com nossa arte e artesanato, a fusão da culinária internacional
com os ingredientes e temperos locais, a identificação de uma identidade
visual que valorize os elementos da cidade no design de moda e
arquitetônico, um jeito carioca de se hospedar, e por aí vai.
Finalmente, e talvez a mais importante discussão que precisa ser feita no
setor do luxo do mundo inteiro, é justamente sobre o conceito do que é luxo,
podendo o Rio de Janeiro inclusive tomar a dianteira nesta contemporânea
reflexão. Muitos profissionais ainda confundem luxo com marcas caras e
inacessíveis para os “pobres mortais”. Segundo os dicionários, luxo pode até
significar magnificência, ostentação e suntuosidade, mas o conceito de luxo
que realmente precisa ser discutido na nossa sociedade atual, onde se
mercantiliza até o afeto, é o do luxo sustentável. Conceito este que
valoriza o que é sublime: a alma, a emoção, o especial, e por que não dizer,
o simples, que nada tem de simplório.
As recentes crises econômicas mostraram que o capital vai e vem, marcas
novas são criadas a cada momento, mas uma coisa até hoje não mudou e nunca
mudará: a necessidade do ser humano de ser amado e sentir que pertence a
algo superior. Enquanto continuarmos buscando isso em marcas, exibicionismo
e frivolidades, poderemos até PENSAR que estamos consumindo luxo. Mas SENTIR
o luxo de verdade é saber quem você é e pagar o preço das suas dores e
delícias. Pois bem, pode ser que esteja aí a base que vai sustentar o luxo
carioca, talvez o luxo que o mundo mais esteja precisando para continuar
sendo um lugar bom para se viver.
André Dametto atua como consultor de gestão, professor e coach executivo