Preguiça Acadêmica
Tom Coelho
02/12/2006
"Nada fazer é o caminho certo para não ser ninguém."
(Nathiel Hower)
Ela foi lançada em 1964 e teve sua primeira edição esgotada em
apenas dez meses. Rapidamente tornou-se não apenas um objeto de
desejo, mas um instrumento singular de apoio educacional. Nos anos
setenta e até meados dos oitenta, foi o melhor presente que pais
poderiam conferir a seus filhos, muitas vezes adquirida com
dificuldade mediante pagamento parcelado. Estou falando da
Enciclopédia Barsa.
Lembro-me daquela coleção com dezesseis livros de capas vermelhas e
letras douradas que me auxiliava nas tarefas escolares e me abria as
portas para um mundo surpreendente esperando para ser desvendado. O
atlas geográfico suscitou-me a curiosidade por países, bandeiras,
moedas e idiomas. E as pesquisas aos diversos verbetes estimulavam o
prazer pela leitura e, por conseguinte, pela escrita, uma vez que os
temas consultados tinham que ser relatados num caderno ou em
atividade acadêmica para ser entregue.
Com o advento da internet as enciclopédias caíram em desuso. Hoje,
um estudante não precisa mais folhear páginas a procura de uma
informação. Basta acessar um site de busca para localizar o tema de
seu interesse, muitas vezes com milhares de links relevantes.
Depois, é copiar e colar o texto, imprimindo-o e dando por encerrada
a missão.
Neste processo, há muitas perdas. O prazer pela leitura se dissipa.
Jornais, revistas e livros são proporcionalmente veículos menos
utilizados. E o hábito da escrita também se esvai. Papel e caneta
são substituídos por processadores de texto. A emoção e a
personalidade presentes na caligrafia dão lugar à frieza dos bits e
bytes.
Mas a facilidade de acesso à informação também trouxe consigo um
efeito colateral: os jovens estão ficando mais indolentes e
apáticos. Quase diariamente recebo mensagens de universitários
solicitando artigos, ensaios, gráficos ou qualquer tipo de material
que possa ajudá-los em um trabalho acadêmico ou na elaboração de
suas monografias. Há ocasiões em que estes pedidos chegam de forma
serena e consciente, deixando claro que minha eventual contribuição
será acessória, complementar à atividade que desenvolvem.
Todavia, há circunstâncias nas quais os pedidos que me visitam vão
desde a definição de uma palavra que pode ser encontrada nos
dicionários (estes, também em desuso) até a mera transcrição, na
íntegra, de uma tarefa proposta, incluindo data para entrega e
regras para apresentação. Assim, o estudante encaminha as questões
tal como lhe foram formuladas, esperando respostas prontas que
possam eximi-lo do trabalho de pesquisar, ler, compilar, enfim,
estudar.
Esta verdadeira febre assola também as chamadas comunidades
virtuais. Quem participa de grupos ou fóruns temáticos de discussão,
sabem o que estou dizendo. E, neste caso, a conduta se estende
também a profissionais à caça de planilhas, testes de avaliação,
dinâmicas de grupos, entre outros.
Informação e conhecimento devem ser compartilhados. Por isso, jamais
deixo sem resposta um leitor, qualquer seja sua demanda. Mas vejo
com preocupação este comodismo, às vezes travestido de oportunismo,
porque me faz lembrar Confúcio que dizia: “A preguiça anda tão
devagar que a pobreza facilmente a alcança”.
Tom Coelho!, com formação em Economia pela FEA/USP, Publicidade pela
ESPM/SP, especialização em Marketing pela MMS/SP e em Qualidade de
Vida no Trabalho pela FIA-FEA/USP, é empresário, consultor,
professor universitário, escritor e palestrante. Diretor da Infinity
Consulting e Diretor Estadual do NJE/Ciesp. Contatos através do
e-mail tomcoelho@tomcoelho.com.br.