A Negociação na era da informação digital
Por Fernando Silveira
06/03/2004
Uma revolução silenciosa está acontecendo hoje, em todo o mundo,
seja nos negócios, na política e até mesmo na família.
Vivenciamos na era da informação digital uma era da grande revolução
na negociação.
Conforme constata William Ury, de Harvard, atualmente as grandes
maiorias das decisões são horizontais: dependem de equipes de
trabalho, forças-tarefas, “joint-ventures”, alianças estratégias,
fusões e aquisições de empresas. Também na família muitas decisões
são conjuntas.
A chamada globalização traz mais interdependência não obstante
tentativas de isolamento por parte de algumas sociedades, como os
Estados Unidos de hoje.
Vejamos alguns aspectos da negociação com suas estratégias e
planejamento no ambiente da informação digital disseminada
principalmente pela Internet.
Ury nos informa que na medida em que as pessoas precisam
desincumbir-se de suas tarefas nas organizações elas estão na
dependência de uma rede de indivíduos e outras organizações sobre as
quais não possuem qualquer controle direto.
Não se pode mais impor uma estratégia, uma política ou uma decisão:
tudo necessita, direta ou indiretamente, da ferramenta negociação
para a obtenção de um resultado positivo.
Logo podemos verificar que a interdependência é uma realidade tão
global quanto empresarial e esta realidade depende de ações
negociadas para fazer girar a roda dos negócios e fazer a empresa
lucrativa.
Como se vê as interações organizacionais exigem contínua negociação
e renegociação em um ambiente de constantes mudanças impostas pela
realidade dos negócios.
As decisões têm que ser tomadas em conjunto. Não há mais espaço para
o centralismo. E para tomar decisões em conjunto, ouvindo a todos os
interessados, tem-se que negociar e cada vez mais rapidamente seja
onde, quando ou como for.
É aí que a era da informação digital entra no cenário, alimentando a
necessidade do processamento e gerenciamento dos dados e informações
pertinentes a cada situação a fim de permitir tomada de decisão
coerente com o objetivo empresarial.
É preciso negociar não apenas localmente, intramuros, mas
regionalmente, nacionalmente e mundialmente, em fantástica
interdependência, mesmo sabendo que existem hoje, no mundo, cerca de
seis mil culturas diferentes!
O desafio é este: como nos comunicar eficazmente para poder
trabalhar em uma causa comum e negociar produtivamente com a
velocidade que a nossa era exige?
Convém lembrar que maior interdependência se traduz em mais
conflito. Como na família, quanto mais interdependência entre seus
membros maiores as chances de posições conflituosas.
O mesmo acontece nos negócios e na política.
Basta ver, como exemplo, fusões como a da HP com a Compaq ou os
sérios problemas entre palestinos e israelenses ou entre os
separatistas espanhóis do país Basco e da Catalunha.
Maior interdependência nos negócios ou na política, por exemplo,
gera maiores vulnerabilidades. Em 1998 por falha de negociação a
fábrica da GM em Michigan, Estados Unidos, iniciou uma greve que se
espalhou por toda a empresa.
Com toda a disponibilidade de gerenciamento da informação e de
Internet a GM não foi competente para negociar eficazmente superando
a barreira do impasse. O preço disto? 110.000 demissões em seis
meses!
Portanto não basta negociar. É preciso suportar as estratégias de
negociação com modos operativos de tratamento e gerenciamento da
informação utilizando os meios mais globais como a internet.
Isto conduz a mais velocidade nos eventos negociais e resulta em um
processo mais cooperativo.
O tempo é hoje um importante parâmetro na negociação. Negociação
produtiva leva tempo. A consolidação de confiança mútua leva tempo,
como lembra o citado Ury, em Getting to Yes!. E para negociar rápido
será preciso investir tempo anterior em uma relação de ética e
confiança.
As grandes corporações já descobriram isto: a mesma GM do exemplo
anterior mudou sua postura de negociação e há pouco fez uma aliança
estratégica com a sua concorrente japonesa Toyota. O mesmo aconteceu
com a alemã Mercedes-Benz e a norte-americana Chrysler, superando
barreiras não só comerciais como culturais.
No Brasil o grupo Pão de Açúcar negociou aliança estratégica com os
franceses da Sonafe para vencer seu concorrente também francês
Carrefour.
Não estou falando de simples aquisições mas de verdadeiras alianças
negociadas em prol dos objetivos comuns e da superação da
concorrência.
A revolução digital também gerou alguns sinais de alerta: com a
internet há muito menos contato pessoal. O endereço eletrônico
(e-mail, ICQ, etc.) substitui muitos encontros pessoais Não se pode
medir reações do tipo LNV (linguagem não-verbal) nem gestual. Não
existe o olhar nos olhos do outro negociador.
A apresentação de produtos via home-pages, banners ou outros meios
típicos da internet pode levar a dúvidas ou busca de detalhamento.
A negociação de uma venda pela internet demanda um perfeito controle
logístico e estas ações são geralmente terceirizadas para o Sedex,
Fedex, UPC e outros, gerando a possibilidade de falta de controle
sobre o final do processo.
Isto nos remete ao alerta de John Nasbitt (Megatendências): high
tech=high touch – alta tecnologia = alto contato, ou seja, quanto
mais usamos os meios digitais para negociar mais necessitamos de
relacionamentos pessoais e procurar identificar e traçar o perfil
negociador da pessoa da outra ponta da comunicação eletrônica.
Pode-se procurar informação com outras pessoas que tenha se
relacionado com aquele negociador com o qual no momento estamos
atuando. A boa reputação tem a mesma velocidade da má. Não se pode
considerar apenas a posição hierárquica. Será interessante buscar-se
um perfil completo já que na negociação digital a distância
dificulta a análise pessoal.
A revolução da informação está aí para ficar. Mas as pessoas
continuarão e serão sempre os componentes mais importantes da
negociação ainda que se valendo dos meios digitais para negociar
mais rápida e globalmente. As novas tecnologias acenam com grandes
possibilidades de troca de informações negociais e o próximo passo
será a maior integração e treinamento dos negociadores envolvidos.
Fernando Silveira, Administrador e Advogado, é especialista em
Negociação atuando desde 1982 em todo o país e pode ser acessado
pelo endereço fsilveira10@msn.com