Ao Sucesso
Por Luís Sérgio Lico
11/11/2008
Há neste país (e na América Latina, em
geral) uma cultura pequena de "não
valorizar o trabalho". Empreender sem
risco, investimento ou esforço é o ouro
de tolo. Todos esperam ser atendidos em
suas necessidades, de acordo com suas
idiossincrasias e, pasmem, na hora que
têm vontade. Esperamos que terceiros nos
digam o que fazer, que “especialistas”
validem opiniões e por aí vai. Isto é
sintoma de que ainda estamos na
"menoridade", por nossa própria falta de
esclarecimento ou, em bom alemão:
Aufklarüng. Mas, deixemos a profundidade
de lado, para não aumentar nossa culpa.
Como eu estava dizendo, de alguma forma
não acreditamos em nosso potencial. A
maioria das pessoas, quando não está
sonhando em ganhar na loteria, exige que
o governo resolva seus problemas e sejam
abolidos os impostos. Em casa,
demandamos compreensão da família,
diminuição da violência, preços baixos e
respeito dos filhos. Normalmente o que
vemos de manhã à tarde é um desfile de
ressentimentos. Pergunte a alguém: -
Como vai. Tudo bem? Se ele for sincero:
Senta que lá vem a história!
Na vida profissional a ladainha do
“alguém precisa me ajudar” é uma triste
constante: os fornecedores devem ser
"parceiros", os compradores precisam
notar o “valor agregado” dos produtos; o
patrão tem de reconhecer e valorizar
nosso trabalho! Já nossos subordinados
devem dar “mais contribuição” e menos
problemas. Se a coisa não vende, o
produto é ruim, o preço é alto ou os
dois. Quando o prazo estoura, houve
necessidade de contingenciamento. Se
estivermos soltos no “mercado” é preciso
que apareçam vagas e quando acaba a
reunião, esperamos que aplaudam nossas
idéias.
Apostamos nossa existência em fatores
externos, tidos sempre como “direitos”
embora poucos saibam o que significam
deveres. Isto está presente em todas as
áreas. Do que falo? Além do “efeito
vaselina”, sofremos da falta crônica de
visão de longo prazo. E, para piorar,
estamos voltando ao dualismo, ou como
dizem hoje em "informatiquês":
pensamento binário. Simples: É ou não é!
Server ou não server! Velho ou novo! Bom
ou ruim! Contra ou a favor! Mas o que é
a realidade: Como consultor, analiso
todos os dias pérolas e absurdos, que
são tratados como "verdadeiras" questões
vitais:
- Pô! Fui lá e não tinha nada! Eu
avisei.
- Gente! Não pode mandar email fora do
perfil!
- Dane-se o seu departamento. O mundo
não é justo e as empresas também não
(putz!)
- Alguém sabe como trabalhar aqui? Me
mande de novo as planilhas...
- Pode olhar no estoque... Sumiram 14
toneladas!
O ponto culminante desta situação é que,
mesmo as organizações demandando cada
vez mais “competências” para uma função,
o negócio não vai para frente. Há muito
ralo, muita “fábrica oculta” bem diante
do nariz do “board” e o pessoal fala o
dia inteiro nas “5 forças de Porter”,
“Gestão Estratégica” ou a necessidade do
“Tarot Siberiano” na seleção de pessoal.
Agir em bases racionais, recompensar
talentos, rever processos, demolir os
preconceitos, qualificar ou implantar
inovações, não! Aí estraga a
brincadeira!
Eu tenho a impressão que o CHA que as
pessoas tanto falam deve ser de
cogumelos! Mas a questão principal não é
"técnica", mas ética: Vemos os outros,
seus serviços, seus pertences, suas
idéias, suas vidas, sentimentos, corpos,
experiências e domínios como "parte da
sociedade" e, por extensão de nosso
mundo. Então chutamos o pau da barraca
logo de cara, pois nossa individualidade
narcisística exige reparação. Ficamos
indignados com a distância a que são
relegados nossos anseios e descontamos
no primeiro que aparece. Ao nos
sentirmos desvalorizados, desvalorizamos
o entorno de nossas relações. Quando
vemos, estamos distantes de nossas metas
e desgastados precocemente.
A falta ética também é ignorância dos
problemas comuns e que recusamos a
considerar como importantes. Quem deseja
rumar em direção ao sucesso deve estar
consciente da topografia a ser vencida.
Isto inclui, desde as mais imponentes
muralhas, até o insignificante
pedregulho. Aliás, cuidado com eles,
pois a maioria não tromba com a
montanha, mas é derrubado pela sucessão
de pequenas coisas. O que eu relato aqui
pode ser estendido para toda a nossa
gestão. Ela deve ser sustentável ou
perecerá.
Ou seja, vale desde o topo ao chão de
fábrica, dentro de uma espiral lógica.
Inclui a “tomada de posição”, mas
principalmente consciência da missão.
Esta postura deve ser retransmitida por
todas as formas de comunicação: aos
emails que não respondemos; aos
telefonemas que não retornamos; a
atenção às pessoas importantes que nunca
ouviram de nós que as amamos, às
desculpas que nunca pronunciamos, aos
profissionais que retiramos da
invisibilidade ao dizer: bom trabalho!
Não é suficiente acreditar que basta nos
indignamos, para tomar as rédeas de
situação. Quem pensa assim está fora da
realidade: A Indignação é revolta contra
um estado de coisas e pressupõe AÇÃO.
Normalmente apenas reclamamos e em nossa
covardia frente às "economias de
mercado" ao mundo ou às opiniões
aceitas, nos escondemos na hora do
combate. Para usar uma expressão
desgastada de Hannah Arendt, sofremos de
uma "banalização do mal". Para sair
desta situação é preciso determinação e
valor.
Parafraseando Gandhi: O sucesso não é
uma meta, mas o próprio caminho!
Luís Sérgio Lico é Palestrante e
Conselheiro Organizacional. Mestre em
Filosofia e Especialista em Gestão do
Comportamento. Autor dos Livros: O
Profissional Invisível e Fator Humano.
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