Cliente Morto Não Compra
Por Luiz Renato Roble
02/02/2010

Certa vez ao entrar em uma ótica, tive a impressão de estar dentro do filme A Rede, em que a personagem de Sandra Bullock se encontra metida em uma cilada. Ela descobre que de repente sumiu do mapa, os vizinhos não a reconhecem, os cartões de créditos foram cancelados e seus documentos nunca existiram.
Sabemos que hoje em dia, por diversos motivos, é cada vez mais difícil existir clientes fiéis a uma determinada loja. Na referida ótica, entretanto, pelo menos do meu ponto de vista, imaginava haver fidelidade. Entre outras coisas, naquela loja, eu era quase reconhecido pelo nome e como quebro constantemente as lentes dos meus óculos, não era mais necessário levar a receita médica, cada vez que precisava de uma nova lente, pois as informações necessárias já estavam em poder do laboratório.
Naquele dia, coloquei como sempre fazia, os óculos com uma das lentes quebradas sobre o balcão. A vendedora ficou olhando para mim como quem pergunta, o que significa isto? Eu disse à ela o que eu queria e em seguida ela perguntou-me onde estava a receita. Expliquei minha história e aproveitei para questionar, por que nunca me haviam feito tantas perguntas antes. Naquele momento então descobri, que como cliente daquela rede, mais especificamente, daquela loja, havia sido traído.
Ela perguntou-me se não estava notando algo de diferente na loja. Sorrindo disse que a empresa havia feito um rodízio. Os vendedores que trabalhavam naquela loja, estavam em outras lojas da rede ou tinham sido demitidos. Logo após esta descoberta, fiquei sabendo também, sempre através de um sorriso da nova vendedora, que o novo prazo para a entrega de consertos era maior do que o realizado anteriormente, que ao contrário do que era praticado até então, teria que deixar um sinal ou pagar adiantado e de quebra, que o cartão do meu banco não estava sendo aceito pelo sistema. Friamente falando, a empresa dizia que não importava à organização se era a primeira vez que eu entrava na loja ou se era um cliente antigo e fiel. Concluí que minha fidelidade pouco importava.
A identidade de uma empresa deve ser construída buscando um equilíbrio entre os fatores comerciais, estéticos e humanos. Em outras palavras, mais importante do que a ótica estar situada em um ótimo ponto comercial, pertencer a uma rede conceituada, ter muito, muito mármore na fachada, nas paredes e no chão, era perceber que ali existia, ou deveria ter existido, todo um passado, feito de histórias humanas, decorrente do atendimento ali oferecido com laços mútuos de simpatia, que com certeza, construíram a fidelização de muitos clientes.

O ponto em que quero chegar é que não se deve fazer muitas mudanças significativas simultaneamente em uma empresa. Pode-se estar alterando, de uma forma violenta, a percepção que os clientes e os próprios funcionários têm dela. As mudanças precisam ser aplicadas em etapas e dentro de um planejamento. Caso isto não seja levado em consideração, o efeito colateral pode causar incômodo e vertigem como num romance kafkaniano.
Uma empresa não deve ignorar os aspectos humanos, jogando fora seu passado e matando seus clientes. As empresas vencedoras, são aquelas que além de ser economicamente viáveis, produzem, além de lucros, valores estéticos e sociais. As que conseguem sintetizar estes valores, serão as líderes do futuro.

Luiz Renato Roble criacao@datamaker.com.br
Designer e Diretor de Criação da Datamaker Designers www.datamaker.com.br

Fonte: Datamaker