Diário do Futuro - Parte 1
Por Luís Sérgio Lico
19/03/2008

Os bombeiros continuam a remover os destroços, existe muito dano em volta. Agora está dando com o martelo, vai daí de cima comandante Dair. Positivo.. Ééé.. A visão geral mostra o entorno destruído. Agora a fumaça já baixou e dá pra ver a rua. Você vê os maçaricos também Adnaldon? Eles estão chegando agora com cães farejadores. Olha lá! Tirou uma mão. Agora tá vindo o braço... Ah! Só o braço. Dá um close rápido. Juzila! O comandante informa que não tem como chegar abaixo antes de a estrutura esfriar. Parece que não teremos mais mortos. Ééé... Aqui acabou! Vamos almoçar. Ok. Juzila é contigo em São Paulo.

Obrigada Adnaldon, resumindo, desta vez não foram nem 170 vítimas. Podemos comemorar a menor taxa dos últimos quinze dias, Olifar? Olifar? Bem, estamos com um probleminha no áudio. As variações magnéticas na eletrosfera estão danificando os equipamentos com mais freqüência, mas o governo afirma que tem investido no setor. Esta semana está tranqüila e nosso recado é para você que não embarcou no vôo 147: hoje é seu dia de sorte.

Enquanto aguardamos o link vamos ao Rio de Janeiro: O caso do roubo dos mísseis do arsenal da Marinha. O ministro diz que não se pode culpar a instituição por um erro de meia dúzia. Guerra do tráfico, até quinta-feira: 82 baixas. Hospitais continuam fechados e vigiados pelo Exército. Em Brasília continuam as discussões sobre a invasão venezuelana em Roraima e o combate à narco-guerrilha na Amazônia. Quer comentar alguma coisa Eloílson Tredes? Não? Vamos então à previsão do tempo: tempestades boreais castigam todo o hemisfério norte, o número de mortos pelo granizo pode passar de 25.000. Aqui, teremos muito calor... A mínima deve ficar na casa dos 42 graus. As praias continuam interditadas pelo crescimento das águas-marinhas e algas venenosas.

São Paulo urgente: A indústria farmacêutica aumenta na próxima terça em 300% o preço dos protetores solares. É o segundo aumento em 60 dias. Foi negociada pelo governo a redução no tamanho das embalagens, para minimizar o impacto ao consumidor. Corra para garantir o seu antes do verão! Continua proibido o uso de energia elétrica residencial entre 10h00 e 18h00...

Está espantado pelo horror acima? Não deveria, pois estamos entrando numa nova era que vai fazer você correr atrás da evolução humana. Ah, não gostou da maneira rude de tratar vítimas? Mas, isso já acontece você é que não percebeu. Em mkt-economês chama-se superexposição por pico de demanda. Traduzindo, quando há excesso de alguma coisa, qualquer que seja (produto ou não) ele se torna banal e é tratado como produto/relação de fornecimento (humano ou não). Motivo de piada.

Isto é bom, dizem os especialistas. Se aumentarem as catástrofes, por exemplo, pelo aquecimento global haverá uma padronização na maneira pela qual se mostram os acidentes. Isto vai facilitar a comunicação, embora as vítimas percam status, pois serão tantas que a pauta apenas considerará a contagem de corpos. Enquanto isso, a parte que restou da “economia de mercado” continuará a consumir informações, produtos, comentários e ilusões. Relaxe. As coisas são assim, dizem os consultores. Não ligue se o modo de vida que conhecemos desabar por suas contradições internas, seja assertivo e busque o sucesso.

Parece, mas não é ficção. A pós-banalização já ocorre hoje em outra modalidade, corporativa, trazendo influências sobre o modo de pensar o jogo. Quer um exemplo? Análise de competências. Após o estabelecimento das últimas métricas, acaba de surgir outra, que fica no limite entre o cinismo e a necessidade. Ninguém acredita mais que pode mudar o mundo, no entanto, também está difícil controlá-lo, sequer geri-lo!

Agora, para medir a velocidade do naufrágio todos arriscam um palpite. Uma convulsão alhures em ultramar pode ter impacto arrasador, só que agora não são as grandes movimentações de capital “opressor” que assustam, mas a quebra da matriz energética e moral. Estamos ficando sem o combustível e o equilíbrio necessários para a infraestrutura, ou seja: civilização e sociedade passarão a ser mais caras, nas próximas décadas.

Você precisa deixar os segredos de lado e ir comprar protetor solar! Ou, então, começar a modificar este quadro, atuando e se fazendo ouvir. De qualquer modo será muito rápida a transição. Logo haverá o point of know return só que não vai dar para voltar atrás. Mesmo porque, cremos piamente nestas metodologias suicidas do "mais por menos" e "abertura de novos mercados". Um dia não haverá mais esta "episteme" econômica e, por mais que tentemos justificar a migração dos stakeholders para Marte, estaremos vivendo num plano social arruinado. Vai querer o quê, Patrão?

Luís Sérgio Lico é Palestrante e Conselheiro Organizacional. Mestre em Filosofia e Especialista em Gestão do Comportamento. Autor dos Livros: O Profissional Invisível e Fator Humano. www.consultivelabs.com.br