A Sexualidade
Feminina
Por Ana Lúcia Pereira, Cíntia Renata
Mion e Maria de Fátima P. Ramos
10/06/2007
O desenvolvimento da sexualidade,
segundo a teoria psicanalítica, não
ocorre da mesma forma em ambos os sexos,
em função de vários fatores de
diferenciação, que procuraremos expor a
seguir.
Enquanto no homem não ocorre uma troca
no objeto de amor na mulher essa troca
ocorre. Ou seja, enquanto o menino
desejará a mãe desde o nascimento até a
interrupção do Complexo de Édipo, a
menina, no decorrer de seu
desenvolvimento, passará a ver sua mãe,
que foi seu primeiro objeto de desejo,
como rival, e sua libido será deslocada
para a figura paterna.
Na fase fálica, tanto meninos quanto
meninas são dotados de falos. É nessa
fase que a criança percebe as
diferenças, e terá que se posicionar
como homem ou como mulher, mas só depois
de passar pelos complexos de Castração
(menina) ou de Édipo (menino), a criança
passará a se reconhecer como pessoa,
inserindo-se na cultura.
No que se refere ao medo da castração,
segundo Lacan, este complexo é o exemplo
da humanização da criança e sua
diferença sexual e a escolha do falo
como marca em torno da qual a
subjetividade e a sexualidade são
construídas revela que elas são
construídas numa divisão que é tanto
arbitrária quanto alienante. Na leitura
que Lacan fez da obra de Freud, a ameaça
da castração não é algo que tenha sido
feito ao sujeito menina já existente, ou
que possa ser feito ao sujeito menino já
existente; ela é, como foi para Freud, o
que “torna” a menina uma menina e o
menino um menino, numa divisão que é
tanto essencial quanto precária. Freud e
Lacan são acusados de produzir teorias
falocentristas – de tomarem o homem como
a norma e a mulher como o que é
diferente dele. Para ambos, na verdade,
explica-se a diferença não utilizando o
homem, mas o falo que o homem tem, como
o termo-chave para a diferença.
A menina percebe que o que faz a mãe
diferente do pai é o falo. Esta, então,
deseja tomar o lugar da mãe e ter um
filho do pai. Quando percebe que o que
lhe falta também falta à mãe, ela
desiste de ser fálica, tornando-se
mulher, identificando-se com a mãe. A
castração, portanto, não é a perda do
pênis, mas a perda da mãe, porque não
tendo o falo como o pai, não é possível
para a menina atingir o desejo da mãe.
Levando-se em consideração essa
transição de objeto que a menina passa
no decorrer de seu desenvolvimento, fica
evidente que a fase referente ao
Complexo de Édipo não poderia ocorrer da
mesma forma em meninos e meninas, e de
fato não ocorre. Enquanto o menino nutre
o desejo de tomar o lugar paterno; a
menina, superado o Complexo de
Castração, torna-se rival da mãe e
deseja ter um filho do genitor.
E é justamente, nesse momento de intensa
rivalidade com a mãe e de inveja do
pênis do pai que a garota precisa
escolher a feminilidade em detrimento da
masculinidade ou da inibição sexual (que
poderá, posteriormente, transformar-se
em neurose).
Tanto no menino quanto na menina, é
necessária a superação do Complexo de
Édipo, para que o desenvolvimento sexual
siga seu curso normal.
Nos meninos essa interrupção ocorre em
função do medo da castração, fantasia
que estes passam a ter quando percebem
que suas parceiras do sexo oposto não
possuem falo e também em função das
perdas afetivas que enfrentam (por
exemplo a perda do seio materno). Na
meninas, que aceitam a castração como
fato consumado, estando portanto isentas
desse medo, porém nem sempre da
frustração por não possuir falo, o
Complexo de Édipo é interrompido quando
percebem que nunca ganharão um bebê de
presente do pai. Em ambos os casos, a
intervenção do pai, contribui para a
quebra da relação mãe-genitora, inibindo
o desejo incestuosos dos filhos pela
mãe.
A troca do objeto de desejo não é a
única transição pela qual passa a menina
no decorrer do desenvolvimento de sua
vida sexual. Outra importante mudança é
a transferência da função erógena
principal do clitóris para a vagina.
Enquanto os meninos começam desde muito
jovens a obter prazer através da
manipulação do pênis e nunca mais
abandonam essa prática, as meninas
masturbam-se através do clitóris.
Somente com a puberdade ocorrerá
recalcamento do clitóris e a
excitabilidade proporcionado por este
será transferido para outras zonas do
corpo, principalmente para a vagina.
Essa transferência foi denominada, por
Freud, como passagem da fase de caráter
masculino (tendo em vista que o clitóris
foi por muito tempo considerado, tanto
por meninos quanto por meninas, como um
pênis atrofiado ou em desenvolvimento)
para a fase de caráter feminino.
Levando-se em consideração as transições
citadas, que ocorrem no decorrer da
mulher, verificamos que o
desenvolvimento sexual feminino é
marcado por diversos conflitos, talvez
em maior quantidade e intensidade que o
masculino. Freud afirma que tanto a
transferência do objeto amoroso da mãe
para o pai quanto da zona de
excitabilidade do clitóris para a vagina
podem marcar o desenvolvimento da
histeria na mulher. Talvez esses fatores
expliquem porque esse tipo de neurose
ocorre predominantemente em indivíduos
do sexo feminino, pois na transição de
seu objeto amorosa da mãe para o pai, a
menina pode abdicar de sua sexualidade,
optando por inibi-la, o que poderá dar
origem a neurose.
Também existem casos de mulheres que não
conseguem fazer essa transição, não
obtendo orgasmos vaginais, permanecendo
o clitóris como principal ou única zona
erógena. Alguns psicanalistas
interpretam tal fato como uma fixação na
fase de caráter masculino, ou seja, a
mulher não conseguiria superar o
complexo de inferioridade pelo fato de
não possuir um pênis, prejudicando
inclusive a passagem para Complexo de
Édipo, que tem como função preparar a
menina para seu papel posterior. Em
alguns casos esse complexo de
masculinidade pode levar ou à
homossexualidade ou a uma vida conjugal
heterossexual insatisfatória.
Outro fator que pode ocasionar
infelicidade nos relacionamentos
amorosos na vida adulta esta relacionado
as mulheres que encontram dificuldade em
superar a fase de enamoramento por seus
parentes consangüíneos (primeiros a quem
ela prendeu a amar) e em conseqüência
tornam-se esposas assexuadas. Algumas
procuram amenizar este problema
casando-se com homens bem mais velhos,
que lembram-lhes a figura paterna e
ajudam a suprir sua excessiva
necessidade afetiva.
Muitos autores lembram a influência que
fatores anatômicos, biológicos e sociais
exercem na diferenciação da sexualidade
no homem e na mulher. Freud, todavia,
embora não desconsidere tais questões,
as considera insuficientes para definir
o que é masculino ou feminino. Daí o
estabelecimento de sua teoria da
evolução libidinal, que procuramos,
sucintamente, expor neste trabalho.
REFERÊNCIAS
MITCHEL, J. Psicanálise da Sexualidade
Feminina. Rio de Janeiro: Campus, 1988.
Psicologia, Ciência e Profissão 1997,
17, (3), 20-27 Olivia Bittencourt
Valdivia – Revista
do CRP