Desculpa Social?
Por Julianna Antunes
14/10/2009
Falar de sustentabilidade corporativa envolve não apenas questões
sociais, ambientais e financeiras ou mudança de cultura e valores.
Envolve, também, reputação. Há pouco mais de dois anos, a Market
Analysis fez uma pesquisa cujo tema era qual empresa o consumidor
considerava mais socialmente responsável. Essa pesquisa apontou
Petrobras, Nestlé e Coca-Cola como as empresas que mais tratam da
responsabilidade social na percepção dos consumidores e colocou a Souza
Cruz como uma das que menos faz. O resultado traz à tona uma questão
muito interessante: por que, quando se fala em indústria tabagista, as
pessoas não conseguem dissociar a conduta da empresa do produto que ela
comercializa? Não estou defendendo a Souza Cruz nem criticando o
resultado da pesquisa, mas analisemos: a indústria de bebidas é tão
controversa quanto a indústria tabagista e não vejo críticas para a
Ambev nesse sentido (pelo contrário, ficou em oitavo lugar). Os impactos
ambientais e sociais causados por mineradoras e empresas petrolíferas
são infinitamente mais profundos e mesmo assim a Vale e a Petrobras são
as duas empresas mais admiradas do país.
Fumar faz mal? Muito. Eu, particularmente, odeio cigarro. Mas não
podemos ignorar que é uma escolha pessoal associada a riscos. E quantas
escolhas de risco fazemos ao longo da vida? Você adora os chocolates da
Nestlé ou não consegue resistir a um sanduíche do MacDonald’s? Segundo a
OMS, a obesidade é a epidemia global do século XXI, sendo responsável
pelo segundo maior número de óbitos passíveis de prevenção. E em relação
à bebida, quantas pessoas inocentes morrem no trânsito todos os anos por
culpa de outros que dirigem alcoolizados?
Entrando no segmento de serviços, recentemente o Bradesco e o
Itaú-Unibanco foram considerados os bancos mais sustentáveis da América
Latina. Você tem noção da taxa de juros cobrada por essas e qualquer
outra instituição bancária no país? Experimenta ficar um ano pagando
apenas o valor mínimo do cartão de crédito e depois me diga se a sua
dívida é sustentável.
Apesar de polêmicos, todos esses produtos que eu citei: fumo, bebida
alcoólica, chocolates, sanduíches gordurosos e juros extorsivos são
perfeitamente legais. Do ponto de vista jurídico as empresas não estão
fazendo absolutamente nada de errado. Em meio à toda controvérsia, o que
eu acho que as pessoas podem fazer, caso se sintam incomodadas, é lutar
com seus congressistas por leis mais restritivas, e, quando for o caso,
punição por desrespeito às que já existem.
Em minha opinião, o produto comercializado (desde que legal) tem menos
importância que a forma como a empresa conduz seus negócios. Eu estou
mais interessada em saber se os funcionários trabalham em um bom
ambiente, se são respeitados, se a cadeia produtiva é sustentável, se a
forma de negociar da empresa é justa com todas as partes, como é a
relação dela com as comunidades, se o relacionamento com as esferas
governamentais é sadio, como os impactos ambientais são mitigados, se a
empresa é ética, se é transparente com seus stakeholders... Desculpa
social? Para mim não.
Julianna Antunes é Jornalista, corredora de alto rendimento físico e
baixo rendimento financeiro, pós-graduada em responsabilidade social
empresarial e diretora da Agência de Sustentabilidade, consultoria
estratégica de elaboração e implementação de projetos de
sustentabilidade. E-mail para contato:
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